ESCRITOS DO GABRIEL

(Tentar que nossas palavras sejam, através de nós ou, quiçá, apesar de nós.
Meus textos, meus rascunhos com erros... )



"Então, um dia comecei a escrever, sem saber que estava me escravizando para o resto da vida a um senhor nobre, mas impiedoso. Quando Deus nos dá um dom, também dá um chicote – e esse chicote se destina exclusivamente à nossa autoflagelação."

Introdução do livro Música para Camaleões, de Truman Capote.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Poesia de calar



As palavras e sua combustão
ar
rancam a poesia de cal
ar
de que
i
mar discreto
por dentro
fôlegos e sal
iva
o vi
dro
moído de ver
sos
que mastigo
sem trag
ar
a
dor

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Verdade e Mentira (versão completa)

O livro da mentira tem muitas páginas. Enquanto existe uma verdade, parece haver infinitas argumentações contrárias. E não precisa ser oposta. Um milímetro fora, já é outra coisa qualquer, deturpada, inexata. (Que dizer então quando se apresentam entrelaçadas?) Seu universo é muito mais amplo, espaçoso. E neste ambiente, tudo é provável. Onde a verdade é gasta, obsessiva, a mentira se derrama aberta, caudalosa de brilho alheio. E o que parece pior: enquanto uma dói, a outra se apresenta como piedosa, fácil e suave ao paladar. Uma não tem preço, a outra se vende, cede constantemente e estuda-se como arte. Dois lados do mesmo rosto; um verossímil, outro inacreditável. Mentir para não magoar; o sabor amargo da verdade e a doce mentira engolida, que lambe, consola. Juntas, uma coalha a outra, abarrotando limites, perdendo sabores e princípios. E não contrastam. A mentira é lubrificada, a verdade é a seco.
O escritor Alejandro Dolina disse ter, no bairro portenho de Flores, dois livros mágicos: um é o livro da verdade; o outro, da mentira. O incrível desta história é que, enquanto o primeiro contém todo tipo de noção exata, revelações únicas da origem do mundo, as fórmulas da arte, até o complexo processo do amor, e o segundo só consigna falsidades, dados corrompidos, levando ao erro quem, porventura, possa e queira consultá-lo; existe um detalhe sinistro nos dois: o livro da mentira é falso até mesmo no seu título, e passa pelo livro da verdade.
Os desafortunados leitores acreditam ter consultado o outro livro. Assim, não há quem pense que suais ideias são oriundas do volume oposto...

Um deles apresenta a seguinte hipótese: “Tanto uma como outra se alimentam do adverso. Tudo é dualidade, tudo tem dois polos, seu oposto; os semelhantes parecem e os antagônicos são a mesma coisa; os opostos são idênticos em natureza, porem diferentes em grau; os extremos se tocam, todas as verdades são semi-verdades, todos os paradoxos podem reconciliar-se. Qualquer sentimento que se origine na negação de outro acaba contendo parte daquilo que acabamos renegando.”
Até quando explica o fundamento do embuste, como, por exemplo, esta hipótese, não sabemos se está novamente mentindo. Praticamente, tudo pode ser refutado.
A foto da verdade ainda não foi tirada. “Minto para que a verdade possa ser entendida. A mentira me engana, a verdade se transforma. E a mentira foi certa... Todos mentem, e ironicamente, todos acreditam ser sinceros, apenas colocamos nomes diferentes. O difícil mesmo é mentir com franqueza, como agora.”, disse um desavisado interlocutor, que acreditando ter lido o volume certo, tenta contribuir para tornar inefável sua compreensão.
Uma outra teoria exposta, mas de difícil comprovação, afirma que a escassos segundos antes de qualquer pessoa morrer, escuta certa melodia; diferente no seu tom e musicalidade para o bom e para o mau, mas igualmente fatal para ambos. Por motivo óbvio, ninguém consegue afirmar nem refutar a informação, independente do livro onde ela estiver.
O número de páginas é essencial, para descobrir, qual seria o suposto verdadeiro volume. Enquanto um permanece imutável, estável e firme, o outro sofre constantes alterações, acréscimos necessários. Precisa se renovar, ampliar, fingir, para não ser finalmente descoberto.
Tudo deve. A mentira não tem paz. Para os mais otimistas, ela é a simples recreação da realidade, uma verdade aparente. A linha que separa as duas parece tênue, mas é na verdade uma divisa perturbadora, arrancada, confusa.
Quanto, e quão intensamente, de cada uma, somos capazes de suportar? Quantas delas necessárias ao dia? De quantas mentiras se necessitam para a verdade ser compreendida?
Dolina também aponta a possibilidade de uma literatura que nasce das ruínas. Ou seja, nada foi perdido, tudo foi escrito assim, propositalmente, com parágrafos faltantes e mentindo na argumentação de perda de palavras, capítulos, que nunca foram escritos.
O final da sua teoria, e desta, como não poderia ser diferente, também se perdeu.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

E se

E se tudo mudasse o nome
E o diverso fosse o mesmo
E se nada fosse outro
E se até não fosse ainda
E se a vida respirasse morte
E se o sonho fosse a vida
E se a parte fosse o único
E se tudo viesse junto
E se o jogo fosse hoje
E se a voz fosse a última
E se o joio fosse trigo
E se nada fosse avulso
E se o avesso fosse o corpo
E se isso fosse aquilo
E se isto nada fosse
E se um fosse muitos
E se desses fossem poucos
E se o ponto fosse umbigo
E se hoje fosse tudo
Quando a soma é o todo?

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Partidas e chegadas

Julio, sou eu de novo... Desculpa atrapalhar a escrita.
Poderias repetir, ler agora em voz alta, do teu “Jogo da Amarelinha” que:
"Nada está perdido si se tiene el valor de proclamar que todo está perdido y hay que empezar de nuevo.", ou que “La esperanza le pertenece a la vida, es la vida misma defendiéndose.", e também que “Cuando me hayan devuelto mi casa y mi vida, entonces encontraré mi verdadero rostro."
Obrigado.
Necessitava ouvir tudo novamente como se não fossem apenas palavras saídas entre dois lábios e sim uma revelação duradoura.

Preciso salvar um sonho. Sustentar seu olhar...
Queria lembrar também que nada mais nada às vezes da um pouquinho de algo.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Meus livros na lama

As águas baixaram e deixaram lama, sonhos perdidos e muita destruição A situação ainda é de calamidade pública em Rio do Sul (SC). De acordo com a Defesa Civil de SC, quase 1 milhão de pessoas foram afetadas pela enchente. Centenas ainda estão desabrigadas e 3 morreram. Poderia contar o quanto perdemos, o quanto foi levado, destruído e chorado...
Não vou.
Cada um com seus tesouros de lembranças, de coisas que nada valem para os outros e que guardava como se nada mais importasse... Entre eles, meus livros, minha história.
Já me desfiz da minha primeira biblioteca quando saí de Buenos Aires e vim para o Brasil. Mesmo assim trouxe mais livros que roupas. Acompanharam as diversas mudanças de casas, de idioma, de vida...
Parte se foi agora e não quero lembrar quando, depois de entrar mais de 2 metros de água em casa (na qual não morarei mais...), e de pensar que ter colocado parte deles empilhados em cima ia salvá-los, vi minhas bibliotecas caídas na lama por não ter suportado a força das águas...
Tentei secar, abrir suas páginas gosmentas, tijolos molhados de folhas, pingando lama, lodo e lágrimas.
Existem certas coisas em nossas vidas que tem um selo dizendo: “você só irá entender meu valor quando me perder – e me recuperar”. Não adianta querer encurtar este caminho.
Poderia listar inúmeros bens matérias que também perdemos, mas eles podem se comprar novamente. Borges citava uma frase de Emerson que diz: “uma biblioteca é como um gabinete mágico que está cheio de espíritos que dormem nos livros".
Eles se foram... Dormem agora nas águas. Não sei quando voltam.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A arte da Guerra

“Uma vez começada a batalha, ainda que estejas ganhando, se continuar por muito tempo, desanimará a tuas tropas e embotará tua espada. Se estás sitiando uma cidade, esgotarás tuas forças. se manténs teu exército durante muito tempo em campanha, teus mantimentos se esgotarão.”
A Arte da Guerra
Sun Tzu


Qual seria a cor da tua bandeira?
Tão difícil como explicar o azul
partindo do vermelho.
Tão arriscado como descer os dedos,
crescer debaixo, manusear palavras
na hora errada,
repetir cedo, o cedo,
transbordar frutos,
reconhecer o mapa, trincheiras,
portas interiores da carne,
onde me perco, onde me salvo
e não.
Ajustar o limite de novas fronteiras
invadidas, que em movimento,
tomam sua forma.
E tu, detrás dos montes, rendida já,
agitando flâmulas brancas, exausta,
contando baixas.
E eu, recolhendo pontes, armas,
a espuma da costa
que escreve e apaga,

que escreve e apaga.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Poesia Urbana


O escritor riossulense Gabriel Gómez foi contemplado na segunda-feira (29), com menção honrosa por ser um dos ganhadores do Concurso Cultural Poesia Urbana, uma iniciativa do Centro Universitário de Brusque (Unifebe), que tem como objetivo promover a cultura catarinense entre a comunidade regional.
De acordo com os organizadores, o incentivo à cultura e à produção literária é um dos caminhos para a mudança social e transformação da comunidade. “Promover esse concurso é, para nós, uma oportunidade de levar arte e beleza a todos os públicos, encantando e instigando o interesse pela leitura”, explicam.
Para o escritor, ações como esta acabam difundindo a arte da poesia entre todos os segmentos da população. “Acho muito interessante que pessoas conheçam parte de meu trabalho através desse projeto, que valoriza o artista”, explica.
A Comissão de Avaliação dos trabalhos contou com oito integrantes, entre eles professores, jornalistas, escritores e mestres em literatura.
Seu objetivo foi selecionar poemas para serem divulgados nas janelas dos ônibus do transporte coletivo local. Com o apoio da empresa de transporte coletivo Santa Terezinha e da Secretaria de Educação de Brusque, os poemas ganhadores atingem o público das cidades de Brusque, Itajaí, Balneário Camboriú, Blumenau, Guabiruba, entre outras.

(A poesia tinha que ser inédita e de no máximo 50 palavras).

Esperando

Em cenários solitários a gente se abre,
muda, compreende-se mais,
um pouco mais.
Por isso deserto, estou aqui,
esperando, alheio, esperando.
Alcança já que esteja
vendo se chego.
Partido em dois,
entre meus braços,
entre teus braços,
esperando-me,
espero.


(texto do jornalista Rafael Beling)

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