ESCRITOS DO GABRIEL

(Tentar que nossas palavras sejam, através de nós ou, quiçá, apesar de nós.
Meus textos, meus rascunhos com erros... )



"Então, um dia comecei a escrever, sem saber que estava me escravizando para o resto da vida a um senhor nobre, mas impiedoso. Quando Deus nos dá um dom, também dá um chicote – e esse chicote se destina exclusivamente à nossa autoflagelação."

Introdução do livro Música para Camaleões, de Truman Capote.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Argumento

"... O tema deste conto é um ladrão de lembranças e sua última e desafortunada vítima.
Independente do lugar, o personagem volta pra casa cansado, numa noite como tantas outras. (...) O ladrão sai da sua moita e pede para lhe passar de forma rápida todas as suas melhores lembranças. O jovem recuado esvazia uma por uma: o beijo da sua mãe antes de deitar, seu primeiro dia de escola, a solidão do seu quarto...
O ladrão não conformado quer mais, quer tudo. Ele lhe pede aos gritos que despeje seus melhores sonhos. Então lhe confessa a promessa de um cargo melhor, de uma vida um pouco mais tranquila... Mas sente o grito de que isso era pouco. Não quer incredulidades... Ele quer sonhos verdadeiros! Quem disse que seu preço é baixo? Neste ponto da trama o leitor é levado a acreditar que por detrás há uma conjura, um conluio, uma complicada trama de interesses e personagens. Nada poderá ser simples, claro, transparente: uma razão obscura que a razão geral desconhece e que não suporta desconhecer terá necessariamente de emergir. Escritores trabalham secretamente na maior parte das vezes, com segredos que até eles mesmos ignoram. Talvez convenha salientar que a vítima poderia estar pronta para, a qualquer momento, sacrificar o que era pelo que poderia vir a ser.
Ameaçado, fala da vontade de ter uma família e filhos, mas não era o suficiente.
“Que mais? Que mais? Não tenho mais, só isso!” – responderia o jovem assustado. O ladrão pareceria não se conformar com sonhos mundanos.
“Ô rapaz, tu tá me escondendo teu melhor sonho! Quero ele agora!”.

Às vezes uma morte digna se torna a melhor aspiração, já que não teve tempo de confessar mais nada. Enquanto o ladrão enterrava impulsivamente o aço da faca na sua carne, ele, desmoronando, ficou feliz por pensar que aquele manuscrito na gaveta, inconfessável, nunca publicado em livro, não seria levado... Seria para sempre seu..."
Trecho do conto "Argumento".

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