ESCRITOS DO GABRIEL

(Tentar que nossas palavras sejam, através de nós ou, quiçá, apesar de nós.
Meus textos, meus rascunhos com erros... )



"Então, um dia comecei a escrever, sem saber que estava me escravizando para o resto da vida a um senhor nobre, mas impiedoso. Quando Deus nos dá um dom, também dá um chicote – e esse chicote se destina exclusivamente à nossa autoflagelação."

Introdução do livro Música para Camaleões, de Truman Capote.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Corpo, limites, beiras (4)

Perdemos alguns contornos de tanto esquecêlos. Como inservíveis elementos de adereço comprados compulsoriamente. E quando tentamos restaurá-los, não entram nem as pequenas certezas. Alguns escapam, encontram o único lugar possível para sair, e caem, estimativamente, pela margem do erro.
Mudamos, e as mãos tentam achar elevações e textura; sentir as formas do acréscimo e da redução. Precárias delas mesmas, presenteiam, sem saber, uma nova e frágil borda. Com receio, se abrigam protegidas, embaixo de roupas, nomes, caligrafias e abraços que reduzem os tamanhos. Os gestos invadem as fronteiras da calma. Entre o corpo e a roupa existe uma distância enorme. Uma contém a figura da outra, e é preciso abandonar, desamparar as velhas, para receber as novas. Sou explorador do meu desconhecido, desperto para novas jornadas e não resisto ao apelo de uma porta fechada por dentro.

Nossas contiguidades são partes da relação topológica com o mundo; tangível não apenas com objetos concretos, palpáveis, de fenômeno previsível. Frágeis, de pequenos confins, apontados com giz ante uma nova alteração. Na superfície de entrantes e salientes, com orifícios e aberturas que levam às profundezas íntimas, reservadas, que se ocultam e revelam nos sentidos. Assim olhamos seus contornos, atingimos seus limites, cheiramos seus odores, provamos seu gosto e podemos sentir o barulho de vozes, as nossas, quando abordam ouvidos e ambientes.

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